02 maio 2011

Para tudo há um equilíbrio

Foi isto que aprendi pela vida fora, que tudo tem o seu oposto, que há um Yin para um Yang, um branco para um preto, um sorriso para uma lágrima...
Eu, que sou balança, sei muito bem o que é isso de (des)equilíbrios. E é por isso que cada vez que me deslumbro com a mais pequena coisa, faço questão de dar graças por ela. 
Dou graças pelo cheirinho a erva molhada pela manhã... é impagável!
Dou graças pelos cúmulo-nimbos que tenho visto (ou pelo menos aqueles que não originam granizos) como enormes algodões-doce no céu, apetecíveis e inalcançáveis.
Dou graças pelo raio de sol que espreita por entre o temporal, a erva pequenina que vinga na calçada, dou graças... por estar aqui a escrever pelos meus próprios dedos, ainda que a minha disposição seja negra...


Há um quê de incompreensão na tristeza. Uma incompreensão que rapidamente vira raiva e logo, logo, frustração. Não somos mesmo nada, nem ninguém... Somos um grão de areia pequenino que se revolta. 
E eu sou das que se revolta, claro. Tristezas? Mortes? Perdas? Tretas! Recuso-me a aceitar, a conformar-me. Que treta essa da conformação! "Não aceito!" foi o que pensei quando atirei com a seringa da água no chão da cozinha, depois de ter acabado de ver o meu cão a morrer.
Atirei a seringa de plástico, mas apetecia-me mandar a loiça toda. Contudo, nem a seringa, nem nenhum dos meus pratos e copos, iria mudar alguma coisa. Ao contrário do que possamos pensar, não podemos mudar nada do que nos acontece, embora possamos fazer muita coisa acontecer... O que podemos é dar sentido, às experiências, às tristezas, às alegrias e à vida.
Uma amiga minha dizia-me ao telefone as palavras sábias que a mãe dela, já falecida, lhe tinha deixado:
- Na vida temos de estar preparados para tudo: para perder os pais, os filhos, qualquer coisa.
Nunca ninguém me tinha ensinado esta. 
Temos de estar preparados para não sermos nada. Para que tudo o que mais gostamos nos possa ser repentinamente tirado. Temos de estar preparados para perder, para abrir mão.
E foi por estes dias que percebi: quanto mais velhos ficamos, mais amargurados nos tornamos, porque vamos arrecadando perdas ao longo da vida, com duas mãos cheias de nadas.
E logo de seguida outro insight: ainda me falta tanto para perder, para chorar, para me conformar...
Ainda tenho uma vida inteira para repetir a dose que estou a passar este ano, vezes sem conta.
Procuro por isso dar sentido a tudo e tentar encontrar algo que faça compensar o meu coração pequenino, de tão mirradinho que está. Assusta-me pôr em causa que isto tudo não tenha, na realidade, sentido nenhum, mas depois lembro-me que já vivi momentos tão felizes em que a minha alegria quase parecia ser pecado, por ser tanta e tão intensa. Tento refugiar-me nesses momentos, pensando que se eles não equilibram o meu presente, então o futuro o fará.
Um dia atrás do outro. Horas em que se chora, muito, em que chorar pelas perdas recentes se confunde com o chorar das perdas antigas. Amealhamos tristezas pela vida fora e sempre que colhemos mais uma, choram-se todas as outras.
Apetece-me deitar esta tristeza toda fora, mas algo me diz que não é assim que se faz. Que se cresce com ela e tal como o estrume (é tudo a mesma merda!) ela alimenta pequenas preciosidades que de tempos a tempos florescem na nossa vida.
Na última semana, pude testemunhar como o André se manteve do meu lado, me deu força, alento e determinação para seguir nesta provação. Se dúvidas houvesse porque vou casar com este homem, todas se tinham dissipado nos últimos dias. Ele esteve do meu lado, por vezes carregando-me e, já lho disse, não o teria conseguido sem ele.
E é isto.
Recuso-me a ceder à tristeza, o que é muito diferente de não estar triste. Recuso-me a coleccionar perdas, para me dedicar às preciosidades com que a vida me presenteia.
Porque a seguir à chuva e trovoada, o sol também brilha.
Porque o sentido da vida não se resume ao correcto funcionamento das máquinas a que damos vida.
Porque é preciso um céu inteiro cheio de escuridão para acentuar a beleza da mais pequena estrela.
Porque as nossas vidas são podadas apenas para crescermos ainda com mais força.