08 julho 2011

Histórias do dia-a-dia

[28 de Junho de 2011]

Hoje sonhei, pela segunda vez, que era o dia do meu casamento e tinha acontecido algo de drástico com o meu vestido. Desta vez não havia vestido. Como podia haver, se a primeira prova só vai ser em Agosto? O meu inconsciente lá se lembrou que hoje ainda não era 24 de Setembro, mas ainda assim aquela angústia manteve-se nas primeiras horas da minha manhã.

Já larguei os comprimidos, aqueles que me apertavam as entranhas 24 horas por dia. Fui ao médico e disse-lhe: "acho que preferia estar deprimida do que estar ansiosa". Pelo menos estava sossegada.
Ele deu-me uma nova marca de comprimidos dos antidepressivos e outra de ansiolíticos, para me aliviar "as borboletas na barriga". As borboletas na barriga são coisas boas, diferentes da agressão interior que eu sentia a toda a hora. Ainda assim pareceu-me bem ter uma caixinha destas pílulas milagrosas, não vá eu entrar em pânico nas vésperas e no dia do casamento.
O que é facto é que sumi com a receita, como quem vai ao médico, ouve o que ele tem para dizer e depois faz só o quer e lhe dá na bolha.
Decidi que queria ter descanso e nos dias após ao abandono dos comprimidos vivi feliz, por cada dia me permitir distender o diafragma sem qualquer vestígio de tensão. Ena pá, que vitória do quotidiano!
Esta pequena alegria alimentou-me durante uma semana e a energia fluiu novamente como se eu fosse de novo eu, aquela rapariga com acção, motivação e determinação. É tão bom saber que estas características não se perderam em mim. Simplesmente, tenho esta tendência para adoecer do humor, algo que é motivado por ideias e emoções, mas que depois desencadeia reacções físicas de entorpecimento do corpo e das vontades.
Olho para trás, na tentativa de ganhar distância dos acontecimentos, e consigo ver que há muitos factores que desencadeiam esta instabilidade:
- comecei o ano com uma pilha de coisas para fazer no mestrado.
- mudei de casa em Janeiro, com todas as tristezas de abandonar uma e toda a trabalheira de pôr a funcionar a outra.
- assisti a mortes consecutivas de pessoas próximas, o que me transtorna sempre e me põe a reflectir sobre o sentido da vida e das perdas.
- acompanhei o meu cão no tortuoso caminho da diminuição de todas as suas capacidades até ao último suspiro.
- revivi a sensação de perder novamente um animal de estimação com a operação cirúrgica da cadela e as respectivas complicações e sustos.
- perdi o rasto ao mestrado com os consequentes sentimentos de culpa.
- estou a organizar o casamento com a energia que o meu corpo me disponibiliza.


Olhando para trás, mais atrás ainda do que este ano lectivo, reconheço que os meus períodos de depressão sucedem épocas de grande desgaste emocional: as chatices que se têm com a escola e a profissão, mas também as chatices que eu tive com a construção da casa. Mais recentemente, foram as chatices com a organização do casamento e a operação e convalescença da cadela.
Tudo mói, tudo desgasta.
Começo a reconhecer o padrão: quando ando enervada, irritada, danada com alguma coisa ou alguém, contestando a forma como se trabalha ou como as coisas estão organizadas, é mais que certo que, daí a uns tempos, esteja a passar por um período de entorpecimento mental, que se alimenta de todas as tristezas circunstanciais da minha vida.


E por isso, tenho-me obrigado a levar a vida menos a sério, como se tudo (este gigantesco circo), fosse de facto uma grande brincadeira. Sem muito para me preocupar, sem nada para me culpar, sem que haja nada de dramático e irremediável para eu antever e prevenir.
Uma brincadeira de verão, onde a despreocupação é o lema do dia.