Descobri esta semana o que já andava a desconfiar há algum tempo. O blog é um programa de entretenimento (pessoal) e não pode ser um muro de lamentações, onde entalo religiosamente os papelinhos dos meus cochichos.
Depois de ter sido descoberta no início do ano lectivo pelos meus alunos no Hi5, coisa que já nem me lembrava de me ter registado, fiquei muito céptica em relação à minha exposição no mundo virtual.
Isto até parece piada - eu que me escarrapacho toda nos cochichos - mas é um facto que tudo o que aqui digo pode ser lido por qualquer pessoa. E assim podia acontecer inofensivamente, se não houvesse pessoas com más intenções, e essas bem podem utilizar os meus cochichos como arma de arremesso.
Isto para dizer...
Isto para dizer tanta coisa, que não pode ser dita nestes termos.
Lembro-me dos cadernos e diários gráficos que carregava na faculdade, onde desabafava o que me ia na alma fosse onde fosse. Escrevia sem acanhamento, porque aquelas palavras destinavam-se só aos meus olhos. Dizia tudo de uma maneira pura, sem censuras, a cru.
O blog permite apagar, fazer um preview, acertar o parágrafo e os espaços... mas nunca num blog vou poder manchar as letras com lágrimas, como antigamente o fazia. Pequenas bolas que desbotam a tinta da caneta, desfocando as palavras acabadinhas de escrever.
Eu falava para mim: o literal "one woman show".
Ralhava comigo e dizia: "Ana Sofia, vê se aprendes!"
Odeio que me chamem por Ana Sofia, e no entanto é assim que me chamo, claro, quando ralho comigo!
Isto para dizer...
Isto para dizer que me apetecia escrever muita coisa, numa forma muito específica, mas ao pensar nas consequências, no que pode acontecer... Afinal isto é público. Quando Sócrates emendou o documento para a sua biografia não sonhava que ele hoje estaria escarrapachado nos jornais, não é? Eu, graças a Deus e a alguma réstia de sanidade, não sou primeira-ministra. Mas ser professora, à minha escala, reflecte a mesma visibilidade. Sou alguma espécie de autoridade, e as autoridades conservam-se com uma determinada imagem recatada, contida, por vezes grandiosa. Qualquer gaffe custa-nos a reputação. Porque os miúdos serão sempre miúdos e eles vivem dessas coisinhas, onde por momentos se sentem a dominar.
Isto para dizer...
que não disse nada e já disse demais.
Não me posso queixar de nada, mas a minha cabeça tortura-me com as mais ínfimas coisas. Consigo infernizar a minha própria vida e vivê-la com uma intensidade já patológica. Mas há tantas coisas, daquelas pequeninas, que apetece escrever, mas que só a mim pertencem e fazem sentido. Não posso, por isso, fingir que neste blog escrevo só para mim. Não nego que nos meus caderninhos também não escrevia só para mim. Muitas das vezes dirigia-me ao leitor, como se fosse alguém diferente da minha pessoa (!).
Isto para dizer...
Isto para dizer que as papoilas, no verde, remam contra a corrente. A papoila é uma flor que traduzida em pessoa, estaria descalça, de saia vermelha ao vento. A papoila alta e esguia tem um ar altivo, quase arrogante. Quando olho para elas entre o verde da paisagem vejo flores despeitadas, que contra tudo e todos se erguem desempoeiradas (como adoro este termo!) sem pedir autorização nem desculpa a ninguém.
Olho para as papoilas todos os dias e apetece-me ficar ali com elas, a bambolear-me, e a chatear as ervas daninhas por não ceder na cor.
Gostava mais de ser papoila.
Não sou.
E as ervas daninhas crescem...
2 comentários:
Há muito tempo que não te visito, confesso. Estou muito ocupado com que está para fora de mim, mas só manifestamente. Latentemente a preocupação é o que está para dentro de mim. Nunca me desliguei desse caminho, por vezes excessivo, mas sempre privado. Também eu tive os diários gráficos durante vários anos, e gostaria de ter a disponibilidade mental para regressar a eles, como se de um diálogo com uma papoila se tratasse: ouve, ouve e ouve, e reage com o seu vermelho invacilante, ela aceita-nos a nós, lá na ordem do seu equilíbrio natural.
Não temo as ervas daninhas, que mais me parecem plantas por enxertar. Nada que se pareça com pessoas, são plantas enxertadas pela cultura, como plantas que nascem viçosas, crescem e deitam semente ou rebentos, às vezes vem uma geada e queima-as um pouco, mas o sol as fará renascer ainda mais fortes, de forma a que quem por elas cruza é contagiada pelas suas sementes produto da cultura, que na essência são muito mais do que isso, são o olhar sobre/dentro dessa Natureza que nos permite ser, deixar que os outros sejam, e proporcionar o nascimento do ser.
Isto não é uma resposta literal ao que escreveste, é o que a tua reflexão me permitiu pensar.
Luís
Obrigada Luís!
Ainda gosto mais de reflexões! :)
Um beijinho para ti!
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