Não sei o que é isso de viver para os outros.
Eu vivo para mim e cada vez mais me assusta este conceito.
Estou quase a pertencer às "SARAH"s (Single And Rich And Happy). Só me falta a letra do meio...
A filosofia desta gente é conhecer-se melhor e enriquecer-se com muitas mais experiências do que o tradicional casar e ter filhos. Experiências que não invalidam estas duas, mas que acabam por atrasá-las. Viajar e estudar, por exemplo. O "Rich" parece-me que advem disso mesmo: não de ser rica, mas de se poder dar ao luxo de ter dinheiro para viajar, estudar e desfrutar de experiências efémeras, mas de degustação apurada e prolongada, como jantares e spas.
Depois há o casamento. Quer dizer... nem me incomoda sequer um pouco. Se casasse as coisas não ficariam diferentes: eu continuaria a gostar de ter tempo para mim, de fazer programas on my own, de pagar metade das contas da casa, de ter uma conta separada e continuar a fazer gastos supérfluos sempre que me sentisse deprimida, sem que ninguém emitisse o mais pequeno rasgo de opinião sobre isso.
A pessoa habitua-se a este estilo de vida e depois todos os outros sabem a pouco.
Gosto de me ver sozinha nas fotos, e não lamento que não tenha pirralhos agarrados às saias. Gosto de conhecer sítios novos e enriquecer o meu banco pessoal de imagens e experiências. Gosto de sentir a liberdade de saber que estou com o André porque quero e não porque um papel me obriga. Gosto de ser independente, auto-suficiente, não prestar contas a ninguém, fazer o que me dá na veneta, e o que gosto, na hora que me apetece.
Egocentrismo? Talvez. A maior parte das pessoas pensa que sim. Eu simplesmente faço questão de não confundir altruísmo com abnegação.
O facto de me colocar no topo das minhas prioridades não significa que ignore todos os outros. Eu sei que há mundo para além de mim. Mas com tanta coisa que tenho para descobrir, desenvolver, trabalhar, estimular e aprender em mim, os outros ficam sempre em segundo lugar. E isto é pecado: "ama o teu próximo como a ti mesmo", mas eu gosto de mim um bocadinho mais.
Gostar de si (e eu gosto, senão não conseguia viver com esta pessoa faladora, desbocada, impulsiva, chata, inconstante, ruminante de ideias e sentimentos), é uma tarefa pouco requisitada, porque tem gostinho a liberdade, de controlo sobre si e sobre o seu mundo. E a liberdade, tenho de reconhecer, é um sentimento muito perigoso. Depressa passa do alargamento do nosso espaço para colidir com o espaço dos outros. E em sociedade o princípio da convivência harmoniosa é basilar.
Admito que este tipo de visão, ou opção, como queiram chamar-lhe, não surgiu em mim sob a forma de iluminação. O mundo é que nos vai batendo, como o padeiro amassa o pão. Mistura as nossas ideias mas dá-nos uma estrutura homogénea, e aumenta a flexibilidade da nossa imaginação para programar cenários para a nossa vida que não sejam os mais óbvios, e muito menos os mais esperados.
A minha mãe tem o desgosto de não ver a filha casar, mas esquece-se que quando comecei a namorar me dizia: "oh, filha, tu não te prendas!" Mas hoje já devia estar mais do que "prendida". Ela vai matando a vontade de ser avó com os netos dos outros, e como lhe reconheço o jeitinho!
Em justificação, perante as amigas, ela diz em replay da filha:
"- A minha não casa, porque tem pavor de receber um dálmata de loiça como prenda! Juntou-se com o namorado e estão a organizar a casinha à maneira deles!"
"- Que é que eu hei-de fazer? Eles não querem ter filhos já. Gostam de jantar fora, fazer viagens e a vida de professora ainda não lhe dá estabilidade para ficar num sítio certo!"
Fico triste por não corresponder às expectativas, mas não abro mão de mim. É isto que quero, e enquanto não me der o vento, é por aqui que quero continuar.
Como já devem ter percebido, o meu nome é Ana Sofia, tenho 29 anos e sou uma self-centered bitch!
4 comentários:
cada um é como cada qual
E o que importa é vivermos felizes com o que somos.
Não sei se este raciocínio é correcto, mas penso que todos somos egocêntricos, todos temos ego e todos nos centramos mais ou menos nele. Talvez haja muitas pessoas que não têm a honestidade de dizer que são egocêntricas como todas as outras. O que me parece é que a palavra egocentrismo não é a mais apropriada para caracterizar o desejo de liberdade nem de autoestima, que é o que na verdade descreveste, na minha opinião, em relação a ti. A maioria das pessoas, julgo, gostam de viajar, estudar, jantar fora, ir ao cinema, etc., sem restrições ou condicionalismos, nos quais se inclui ter filhos. Mas podes acreditar que os filhos nos abrem outras portas de uma outra felicidade que se identifica com uma liberdade diferente, mas também liberdade. Por outro lado, como em tudo, há timings, há circusntâncias e condições ajustadas a cada um. Há uma coisa que penso ser muito negativa, com todo o respeito pela crença de outros, que é a noção de pecado na religião católica (por exemplo) que inibe a pessoa de, paradoxalmente, ser livre como era de desejar. Os deveres concentram-se muito nos outros e em Deus. Mas, só podes concentrar-te nos outros se se te gostares de ti o suficiente...há uma dialéctica entre o amar-se e o amar o outro, não há fronteiras, mas o segundo só existe se existir o primeiro. O estigma luxo é o efeito perverso na sensação de que não merecemos a riqueza. O egocentrismo talvez seja o estigma de que não merecemos tempo, espaço, etc. para nós...
Tudo isto são especulações que não desejo generalizar, porque cada um tem uma forma própria de entender este tema. Para objectivar estas ideias seria necessário escrever muito mais, mas aqui fica um indício de uma opinião.
Para concluir:
A liberdade é formulada conforme a cultura, a história pessoal, a educação, a idade, etc. A liberdade é diferente para uma criança, para um juíz, para um aluno, para um chinês, para um índio, para um brasileiro, para um artista, para um escritor, para um advogado, para um polícia, etc. Cada um cosntroi a sua liberdade à medida do conhecimento de si...
Luís
É sempre um prazer ouvir / ler as tuas palavras, Luís.
Sinto que me entendeste.
Eu não me vejo como egocêntrica, mas sei que é assim que o mundo, no geral, me classifica. E prefiro assumir um rótulo, mesmo que não concorde com ele, do que viver com remorsos por ser assim.
Sou assim, quero ser assim durante mais algum tempo e o que é que tem isso?
Se não faço mal a ninguém, que mal pode daí vir ao mundo?
E se não sentir que devo ter filhos, porque hei-de tê-los? Porque está na hora? Porque os anos não perdoam? Porque a fertilidade é coisa passageira?
Quero ter filhos, sim.
Mas quero tê-los pelas razões certas.
Para que um dia não olhe para eles com desgosto de não ter sugado todas as experiências que havia para sugar.
Se esse dia vier, eu continuarei a não me arrepender das minhas palavras hoje. É uma fase do processo, importante, e diria até, preciosa.
Se esse dia não vier, e os óvulos já tiverem rugas e próteses nos dentes (sim, que os óvulos têm dentes, ora pois claro!!!) paciência! Decerto conseguirei imaginar uma vida igualmente prazenteira.
Não nego o brilho que os filhos podem dar à nossa vida, aliás, se pensar bem acho que iria viver viciada neles. Por isso faço questão de não os ver como o único fim para uma vida bem sucedida.
É que há pessoas estéreis e a fertilidade cada vez mais é um problema na sociedade moderna. E essas pessoas não estão condenadas à desgraça. Estão apenas privadas de um enorme prazer da vida e terão que compensar com outros.
Lembro-me sempre do Dia dos Namorados. Um dia de felicidade e comemoração, para quem está dentro da norma. Para quem tem namorado, e anda para aí aos beijinhos feitos passarinhos. Mas para quem não tem, este dia é um martírio. Era o dia em que eu sentia sempre que me esfregavam na cara o que me faltava.
Até que aprendi: só poderei dar realmente valor às coisas se conseguir abdicar delas.
E como isto custa!
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