Tenho só um tsunami de coisas programadas para esta linda tarde de Outono, mas rebento se não vier aqui soltar um pouco a "franguinha".
Vida de contratada é uma merda!
Não há como dizer isto de uma forma menos grosseira.
Não recebi o subsídio de Natal em Novembro como todos os outros, "porque não sabiam o fim do meu contrato" e por isso só me pagam os duodécimos dos onze meses que trabalhei junto com o último duodécimo: em Dezembro, por supuesto, a dois dias do Natal e a um de ter as lojas abertas.
Felizmente não tenho filhos, nem cartas do Pai Natal para atender. Ia odiar ter de dizer a uma carinha pequenina que o Pai Natal este ano está muito atrapalhado e apanhou trânsito, pelo que as prendas até podem chegar um ou dois dias depois do Natal.
Ontem soube que fico até dia 5 de Janeiro. A fulana tem junta médica nesse dia. Se a mandarem trabalhar apresenta-se no dia 6. Ora dia 5 é uma segunda, e às segundas eu não tenho componente lectiva. Resultado: posso bem começar as aulas na terça e já lá estar a colega a assumir o seu lugar! Estão a ver a cena?
"- Olá meninos, era só para vos desejar um bom ano e adeus!"
Isto até é ver as coisas pelo lado bom. Se a colega ainda meter as férias que lhe faltam, ou for mandada para casa com atestado, eu provavelmente não vou receber o mês de Janeiro. Ora porquê? Porque os vencimentos são processados até ao dia 3 (mais dia, menos dia) e no dia 5 ainda ninguém sabe se eu fico o mês inteiro ou se vou pastar para outra freguesia.
Que simpáticos! Dão-me o subsídio de Natal no Natal e o ordenado de Janeiro no Carnaval!
A cereja no topo do bolo é a contestação dos professores. Os outros, claro, porque eu não sou professora. Eu nem sequer sou considerada pessoal docente no estatuto da própria carreira. Eu sou "carne para canhão", que é o que é uma professora de substituição.
Vou lá preencho os buracos dos outros, e as escolas passam por mim, como os comboios na estação: sem saudades nem grandes emoções.
Vou sair e ninguém vai dizer: "que saudades vou ter de ti", mas reconheço que isso também deriva da minha própria personalidade. Não sou uma pessoa amistosa, e normalmente sinto uns olhares desconfortáveis na minha direcção. As pessoas acham-me... como é mesmo o termo técnico?... ah! Nariz empinado! É isso!
Parvas. Eu tenho o nariz aquilino, mas podem charmar-lhe grande, apinoquiado, o raio que os parta, mas de empinado não tem nada.
A vida de contratada de substituição não é uma vida triste, mas não é a que sonhei.
Ninguém sonha em ser um Zé-Ninguém ou uma Maria-Ninguém.
Isto é uma vida que não dá alento para levantar da cama ao fim de 20 anos e dizer: ora vamos lá começar mais um dia!
Nem ao fim de 6 anos e meio, quanto mais!
Sinto-me sempre como uma coisa descartável, que ninguém quer ou pode guardar consigo. Sou sempre deitada fora, tenha feito bem, tenha feito mal. Sou sempre tratada partindo do princípio que se tenho alguns dos direitos daqueles que são efectivamente "professores" isso é sorte, e não um direito legítimo. Afinal eu sou uma tapa-buracos, uma aspirante a professora.
E vejo tanta merda por aí, tanto mono a dar aulas.
Porra, às vezes tenho a sensação que estupidifico. E caramba, caia-me já aqui um raio para incendiar esta vaidade, mas eu até me considero uma rapariguinha esperta!
Vejo tanta burrice, inacção, estupidez, ignorância, letargia, demagogia e pseudo-pedagogia...
Que raio de mundo é este a que nos habituámos a chamar de Educação?
Que tipo de pessoas são os alunos que saem das escolas? São boas pessoas? Honrosas? Sinceras? Honestas?
A sucessão de pontos de exclamação é puramente retórica, porque depois de saber que há um pobre diabo que termina o 12º ano numa Nova Oportunidade e entra em Medicina pelo contingente da alta competição... bom, tudo é possível.
Os professores agitam-se e os sindicatos também. Eu agito-me contra uns e outros, e obviamente, contra a ministra e o seu superior.
Eu sou uma besta empalhada (porque professora não sou!), porque os meus colegas se marimbaram para a greve na altura da aprovação do estatuto da carreira docente.
Eu vou concorrer por oferta de escola no meu próximo contrato e ser preterida em relação a outra candidata porque um dos critérios de selecção é ter olhos azuis. Eu ando deprimida, mas não tanto!
Onde estavam os 120 mil na altura da aprovação da legislação para contratos de escola? Estavam em casa, a dormir, a dar banho aos filhos, a ver televisão e a fazer o jantar.
O ano passado fui avaliada. Curioso! Ninguém mandou pedir a suspensão de uma avaliação que é implementada em Fevereiro para executar até ao final do ano lectivo que tinha começado em Setembro. Mandaram-me estabelecer objectivos individuais em Abril!!! Ora, por favor!!
Agora ainda estamos no 1º período, e a avaliação que serviu para mim o ano passado já não é suficientemente boa para todos os outros (professores, claro!).
Os sindicatos entenderam-se com a ministra, era só sorrisos, tudo se resolveu a bem e ninguém mais andou para aí na rua a fazer figuras tristes ao frio.
Apetece-me fazer um daqueles silêncios bem desconfortáveis, de 10 ou 12 segundos, olhar as pessoas nos olhos e perguntar:
MAS QUE MERDA... É ESTA?
E vêm-me falar de greves?
Greves, meus amigos?
Greves fiz eu três, na altura que devia! Antes das aprovações dos decretos-lei. E porquê? Porque estava atenta, porque me importava, porque percebi só metade da MERDA que estava por vir e já me assustei.
Vocês não viram foi MERDA nenhuma.
Caiu-vos toda em cima!
Três dias de greve em dois meses diferentes, que prejudicaram o vencimento de um mês só!
Um mês de vencimento de uma contratada não profissionalizada é uma vergonha indescritível, a julgar pelo trabalho que se tem.
E agora, professores e sindicatos, acordam como a lebre e resmungam pela vitória face à tartaruga? Essa é que a fez bem: pela calada.
Agora, não vale a pena lamentar.
Não sou derrotista, sou apenas observadora.
Este governo não vai mudar uma vírgula, porque se o fizesse, este país não tinha mais governo. Os professores não podem pôr em cheque um país, como os camionistas ou os médicos. Deus nos livre!
Dar a ilusão de que os professores têm algum poder? Nem pensar! Afinal o estrago só se sentirá daqui a uns anos, enquanto que os pacientes morrem nas mesas de operação e as prateleiras ficam vazias nos supermercados. Isso sim, é dramático.
Os professores são apenas mandriões que não querem trabalhar!
Contra isto toda a gente se "alevanta". Todos se enfurecem e esquecem a hibernação em que têm vivido. Vamos para a greve e toma lá 90% de adesão a ela!
Greves, meus amigos? Greves???
Se isso é a vossa estratégia para ir contra esta MERDA, então MERDA para vocês!
Eu não faço (mais) greves!
Se eu não sou Professora, e nem sequer considerada Pessoal Docente, então avisem-me quando houver Greve dos Forcados, porque se são sempre os contratados que vão aos cornos ao touro (seja ele avaliação, ministra, contratos precários, etc.) então aí eu faço greve até gastar as fichas todas!
Porque apesar da MERDA toda em que a Educação está metida, eu estou mesmo saturada é de ser (en)Forcada.
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