30 outubro 2006

Errar é humano, saudável e desejável!

Errar é o que mais eu faço, e menos em mim tolero.
Vinte e oito aninhos de asneiras e ainda não aprendi a não me sentir um lixo cada vez que entendo não ter feito as coisas a 100%.

Sobem-me os calores à face, mudam-se-lhe as cores, coro por dentro e por fora e cai-me o imaginário balde de água, sempre gelada, pela cabeça abaixo! "Fizeste m****!" - digo de mim para mim.

A vergonha persegue-me com o cobertor do Linus, e da mesma forma, duvido se não será antes uma obsessão. Estas pegajosidades psíquicas não têm remédio senão contrariá-las com um enorme esforço de racionalização: a desgraça nunca é tão má e irreversível como parece; eu não sou a pessoa ingóbil que me faço crer que sou; e principalmente, as outras pessoas não me vão desconsiderar por completo e para sempre, nem organizar uma manifestação de censura à minha pessoa, ou cuspir-me na cara e incendiarem-me em plena praça pública, como se fazia às bruxas do antigamente!

Num espírito de democracia, tendemos a interiorizar que a maior parte das pessoas toma a mesma posição porque é essa a correcta. A maioria ganha em votos, não em certezas, e muito menos em verdades.

Hoje senti-me ignóbil por 5 minutos e depressa consultei o oráculo (o horóscopo do clix, o mais sintonizado que conheço); tomei a poção mágica (meio litro de água para acalmar) e conjurei o feitiço perfeito: "Errar é humano, saudável e desejável!" quer deveria ser repetido três vezes, ou tantas quantas fossem necessárias para eu acreditar.

Sou uma bruxinha de trazer por casa. Daquelas que falam em signos e a quem os alunos de seguida perguntam se sabe ler as mãos!! Oh, triste sorte!
Amanhã é o dia das Bruxas. E já que não sei ler nas mãos, o melhor mesmo é pôr aquelas alminhas a desenhar abóboras e cabeças de alho.

Como diz a minha mãe:
"Toma lá, que é democrático!"

A menina dos posts!

Sou Directora de Turma, o que mal comparado é tipo um serviço de apoio ao cliente, com a diferença de que eu não atendo ninguém a começar por "Ok Teleseguro, fala a Marta!".

A tralha de coisas para fazer é tanta... Perguntas no Executivo, dúvidas com os colegas, Fazer, Tirar fotocópia, Pedir, Confirmar, Entregar... eu sei lá. Tenho todo o tipo de verbos como entrada nos meus post its e quando eu sou Directora de Turma eles são, sem sombra de dúvida, os meus melhores amigos.

A capa do meu caderno diário é o quadro de afixações importantes. Decidi separá-los por duas colunas: assuntos a tratar com a turma (à direita) e assuntos a tratar extra-turma (à esquerda). A imagem que documenta a minha técnica até é das mais lights - hoje dei-lhes aulas e por isso já despachei um carradão de papelinhos.

Este tipo de organização funciona às mil maravilhas comigo. Eu sou daquelas pessoas que gastou dinheiro num pda e matou-se à procura de um programa de agenda que tivesse a função de cross out, para riscar as tarefas cumpridas. Até já defini no pda uma categoria de eventos que dizem respeito à direcção de turma e adivinhem de que cor é? Rosa clarinho, pois claro, que é a cor das mamãs galinha! :)

Curiosamente, com os miúdos isto também parece funcionar. Quando tenho de dar informações em aula, eles entusiasmam-se bastante sempre que arranco o post it do caderno e o amachuco ao som de um "neeeext!".

Os colegas na sala de professores já repararam e naquela sabedoria anciã comentaram comigo: " ohhh, tu fazes isso porque ainda és nova!"

Será que há limite de idade para se ser minimamente organizada e gostar de ver as coisas feitas?

19 outubro 2006

Papeladas...

Sou directora de turma, do 9ºC.
Levei um tempão para organizar o dossier da turma, recolher legislação, arquivar papelada... e hoje, quando finalmente o fui colocar na prateleira, com uma lombada muito apelativa, radiante por ter arrumado com as papeladas, logo a Coordenadora dos DT´s me colocou nas mãos mais uma resma de coisas: PCT, grelhas, projectos para aulas de acompanhamento, pedido de planificação destes projectos, formulários..... AaaaaaaaHHHHHHHHH!!!!

Estou a dar em doida!

É tudo novo: esquema, sistema, escola, colegas, maneiras de pensar, papeladas, organizações...
É como emigrar toda a santa vez que fico colocada!
Que sina!

Mas ando animada :)

17 outubro 2006

Os meus "pulguitas"!

O tempo é curto e o meu último post foi melancólico. E a tristeza deve aparecer pontualmente, como os raios na trovoada.

Para não correr o risco dela criar raízes, decidi apresentar-vos os meus "pulguitas". Os tais que me fizeram hesitar perante a compra de uma casa fora de Azeitão: "Então e os meus cães? Quando vejo os meus cães?"

De manhã, enquanto preparo o pequeno almoço, abro a porta da cozinha e logo vêm eles ter comigo, de rabinho a abanar. O Freddy está sempre deitado ao fundo das escadas e o mais que faz é levantar a cabeça na minha direcção e articular uma expressão de pura felicidade. A minha pulguita desvairada, a Sissi, é que ao ver-me entra em colapso total, mesmo que tenham decorrido apenas 5 minutos desde a última vez que me pôs os olhos em cima.

Eu é mais cães!

Adoro sentir o seu apoio incondicional, adoro sentir-me um ídolo para alguém, especialmente nos dias em que tenho a certeza que sou uma m****. Quando estou mal, o meu primeiro remédio é ir ter com os cães e ficar a fazer-lhes festas, a penteá-los, a tratar deles, para me aperceber que tenho controlo sobre alguma coisa, que tenho de estar bem psíquicamente porque aqueles dois seres precisam de mim.
São absolutame
nte lindos e como diz o afilhado da Cláudia: "Eu adoro deles!!" :)

O Freddy é um serra da estrela que me foi oferecido pelo André. A ninhada era de dois: ele ficou com o Júnior (que é só de nome!!) e eu com o Freddy. São os dois serras mais lindos que conheço (sim, eu sou uma dona babada!), embora um seja de pelo longo e escuro e o outro pelo curto e claro.
Nesta foto o Freddy tinha 4 meses, e mesmo com 2 meses já era difícil de carregar nos braços. Sempre foi enorme e muito mansinho. Quando dormiu as primeiras noites cá em casa, gania por ficar sozinho. A minha mãe levantava-se e cantava-lhe musiquinhas de embalar - sim, a minha mãe está com um desejo agudo de ser avó! Ele lá adormecia, mas quando acordava a meio da noite, saltava as barreiras que nós lhe púnhamos e ia dormir para onde encontrasse companhia.
Sempre foi um doce de cão!
Mesmo a pesar 52 kg, e conseguindo facilmente derrubar um adulto robusto, o Freddy teve sempre cuidado com a minha avó. Ela ia lá fora apanhar nêsperas, ou ver as plantinhas, e ele andava só à volta dela como que a tomar conta.

Mesmo quando pede festas a táctica dele é muito subtil: põe-se à nossa frente e barra-nos o caminho. Nem precisa de ganir ou pedinchar, é trigo limpo!

Entretanto, o Freddy cresceu. Vai fazer 10 anos em Dezembro próximo. Continua pachorrento e com o mesmo olhar dócil. Teimoso, faz tudo o que lhe mando mas no tempo dele. Aprendeu depressa a sentar, deitar e a dar a pata, e se eu tiver comida na mão é um pri
mor em educação.

Içá-lo para a marquesa do veterinário é sempre uma aventura, e passear com ele, nos dias de hoje, só de trenó!!! É muito vaidoso, porque se delicia comigo a penteá-lo, além de no fim desfilar todo presumido, com a sua camada de pêlo brilhante e sedoso.

Em 2003, arranjámos uma companhia para o Freddy. A Sissi era uma cadelinha abandonada, trazida na mochila pelos miúdos da escola que passam aqui à minha porta. Parecia-se estupidamente com um serra bebé, e vai daí não resistimos!
Hoje vejo que esta cadela podia ter morrido de fome, mas tem vivido como
uma imperatriz!
Vive feliz aqui e adora-me. E eu e a ela. :)

Tendo sido uma cadela abandonada apresentava alguns problemas emocionais e nervosos. Por exemplo, a forma de carinho que ela conhecia era morder, mesmo que de mansinho. Ao fim destes anos todos, é a única cadela que conheço que não sabe lamber o dono para o acarinhar. Com muita paciência, lá compreendeu a manifestar as suas emoções sem ser de uma forma agressiva.

Outro problema era a incontinência. Sempre que se entusiasmava por ver alguém, por me ver chegar a casa, escapavam-lhe umas pinguinhas de xixi. Pobrezinha! A emoção era demais!
Com o tempo também isto passou. O que não passou foi o facto de ela ser linda e muito fotogénica!
O Freddy também não resistiu.
Ela tinha energia pelos dois. Era um autêntico furacão Sissi!

O Freddy nunca teve ciúmes, recebeu-a como a melhor amiga dele e faz-lhe as vontadinhas todas. Deixa-a comer do prato dele, dá-lhe o lugar cimeiro das escadas para ela dormir, que é o seu posto de vigia, e brinca com ela até não poder mais.

A Sissi cresceu assim, mimada por todos. É uma princesinha, muito maria rapaz, que gosta de fazer travessuras, mas que não dispensa a sessão diária de mimos.
Talvez por isso a sua posição mais característica é de barriga para cima. Deita-se aos nossos pés à espera das festinhas, que nunca são demais. É uma oferecida! Mas apesar do que possa parecer a Sissi é uma cadela muito desconfiada! A padeira que o diga!!! Sempre que cá vem trazer o pão tem de levar com a fúria da bicha!

No fundo eu tenho muito em comum com esta cadela. Gostamos de mimos; quando não os temos pedinchamos muito; gostamos de fazer traquinices e sermos em seguida perdoadas; gostamos de chatear o próximo, por vezes até à exaustão; gostamos de festas na cabeça; gostamos de fazer birrinhas para ter o que queremos; gostamos de nos sentar/deitar em cima dos nossos companheiros (perto não chega!); odiamos a música da carrinha da Family Frost (com a diferença de que eu não uivo); e somos muiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiito curiosas!

Não se nota?
;)

08 outubro 2006

"Ciclames, filmes e coincidências" ou "As crónicas de quem cá fica"

Ciclames.
A minha avó adorava ciclames.

Vai uma pessoa ao cinema, ver um filme intitulado de World Trade Center, à espera de ver aviões a embater e prédios a cair, e dá consigo a fazer comparações sobre tragédias e dilemas da vida e da morte.

Quando a perspectiva da morte nos aparece no horizonte, a fé começa, de imediato, a brotar. Vai abaixo, com certeza, mas está lá, até ao dia em que a morte faz da fé um sentimento ridículo e descabido.

Todos os dias que visitei a minha avó no hospital, vinha pelo caminho a pensar: "Ela estava com melhor cara, estava mais animada, vai de certeza ultrapassar isto."
Para as mulheres dos polícias do WTC, a morte era um cenário posto de parte. Não se sabe onde eles estão, nem como estão, mas há uma certeza: estão vivos. E é assim que vão continuar.
Mas esta certeza depressa dá azo à contaminação do "e se?". E é aí que ataca a memória. Quando foi a última vez que trocámos o olhar? E, de repente, pensamos que podíamos ter feito tanto, sem que já nada houvesse para fazer.
A fé às vezes é uma recusa de aceitar o óbvio. Construímos um mundo de possibilidades para escapar à gadanha afiada, e é sempre difícil aceitar que ela nos colheu.

"Não pode ser!"
Foram estas as três palavras que saíram instintivamente da minha boca, perante a dolorosa notícia. Não pode ser.

Pode, pode. Já é.

A realidade prega-nos destas partidas.
Ainda estamos na fase "Xiiii, cum catano!" e já a ouvimos a zombar: "Vai buscar!"
Sem piedade.
Como se a vida fosse, na realidade, uma gigantesca piada.

Por falar em piada:
Vai uma pessoa ao cinema (sim, que eu tenho a mania de dar segundas oportunidades!), ver um filme para rir. Com este é seguro: não vou chorar nem entrar nas pieguices do costume.
Escusado será dizer que saí do filme "Click", com os olhos inchados. Uma autêntica vergonha cinéfila!

Mas ainda agora, não me consigo conter quando me recordo da parte em que ele, por algumas vezes, faz o pai repetir que o ama...
...
...
Quem me dera ter um comando destes...

A vida continua e sabe sempre bem ouvir o típico "God works in misterious ways".
Eu acredito em coincidências, eu acredito em Deus, eu acredito em signos, eu acredito em tudo o que faça da vida uma coisa menos crua. A vida, como ela é, não tem graça nenhuma. Eu simplesmente gosto de a pintar à minha moda.

Sabem que comprei a casa no dia dos Avós? Sabem que da janela do quarto vejo o muro do cemitério onde ela está sepultada? Sabem que estou mais próxima dela na minha casa nova do que na dos meus pais? Sabem que fiquei colocada na semana em que fiz anos? Sabem que a escola me obriga a fazer o caminho que fazia para ir ver a minha avó ao hospital?

Coincidências? Talvez.
Mas eu opto por acreditar que a minha avó me quer ao pé dela para tomar conta de mim. Que a colocação que me calhou (uma sorte absolutamente descomunal!) foi a minha prenda de anos. Que o caminho que faço é para não me esquecer dela.
Eu não esqueço. Eu dou comigo a lembrar-me dela todos os dias, seguramente mais do que uma vez.

Talvez seja por tudo isto, que vejo a minha avó tão presente na minha vida. Talvez seja por isso que sonho com ela viva, sempre.
Ela continua lá, aqui comigo.
A torcer por mim, a rezar por mim, a cuidar de mim.
A única coisa que mudou é que antes, para exercer o seu afamado poder de cunha com Deus, tinha de fazer uma chamada.
Agora é só bater à porta e falar directamente com o Patrão.

Ou pelo menos, é assim que eu gosto de acreditar.

02 outubro 2006

Pim.. calhou-me a mim!

O concurso de professores anda à roda como a lotaria nacional. Ficamos igualmente ansiosos por que nos calhe um prémio, todas as semanas. Até que na quinta-feira:
Pim... calhou-me a mim!


(Tentem dizer o seguinte com aquele pregão da lotaria)
ES-CO-LA de SAN-TO AN-DRÉ!
VIN-ti-DU-as-HO-ras!

- Santo André? - do outro lado do telefone a minha amiga Cláudia continuava com os pormenores do horário e eu só pensava: malas, viagem, alugar quarto, lá vou eu para a costa alentejana.
Espera! O mais que concorri foi Grândola... Santo André - Barreiro!!!
Fixe! Para ser tão pertinho de casa, ainda em Setembro é porque é no limite das minhas preferências: umas 12 horinhas....
- Completo, Sofia! - a voz da Cláudia soava como o despertador hoje de manhã: nem queria acreditar!

Hoje fui conhecer as "pestes". São bonzinhos, faladores, mas bonzinhos. Tenho uma direcção de Turma de 9º ano, que é só das "melhores" que se pode ter... com excepção do 12º. E o melhor de tudo é que estou à nora. Tenho de fazer todo o trabalho do DT no início do ano: inquéritos, tirar faltas, reunião com os encarregados de educação... não tem nada a ver com a direcção de turma que tive de 11º ano, em Portimão. Enfim, espera-me muito trabalho, mas eu gosto. O que custa mesmo é entrar no esquema, depois é segue, segue, segue, segue até encontrar o final do ano.

Os cachopos são espevitados, mas aqui que ninguém nos ouve, estão na idade!
Houve um no final da aula que veio ter comigo e perguntou:
- Que idade é que a stôra tem?
- Se me demonstrares a relevância dessa pergunta, eu respondo-te!
- Oh! Tem 33, não é?

Ai, ai. Eu ainda nem consigo dar bem a volta a língua, para dizer vinte e oito, e o rapazinho já me carrega com mais cinco!
A franqueza das crianças dá conta de mim...