Não tenho nada de jeito para dizer, mas exactamente por isso me apetece falar.
Não gosto de estar calada, não gosto de silêncios incomodativos. Gosto de falar até não mais poder ouvir a minha própria voz, coisa que até acontece amiúde (felizmente).
Estou murchinha, como o tempo. Oiço os passarinhos lá fora, mas dentro de mim ainda chove. Estou desgostada com as pessoas.
É isso.
Desgostada.
Não falo do meu desgosto de mim, porque esse vivo diariamente, sempre a pensar no que faço de mal e no que podia fazer melhor. Desiludo-me a cada momento, mas agora já vou conseguindo encarar que, apesar do erro, ainda tenho a possibilidade de o consertar e/ou de o não voltar a cometer no futuro. A pessoa perdoa-se a si própria e tudo fica bem.
Mas os outros... gostava de não ficar sentida com certas coisas, porque não é chateada. É sentida. São coisas que me magoam e, sabe-se lá porquê, fico triste por terem acontecido, e por isso não as consigo engolir/ultrapassar assim do pé para a mão.
Normalmente, finjo que vivo bem com essas vicissitudes, e olho só para as árvores a rebentar verdinhas, para o melro poisado no pilar do portão da casa dos meus pais, para os desenhos que as núvens fazem no céu, para as andorinhas que aquecem o ninho duplex na entrada da porta, para os ciclistas que apanho a caminho da escola com aqueles glúteozinhos que parecem, vá, bombons, e a quem não resisto mandar uma apitadela e um aceno de motivação.
Finjo que a vida é bela, porque é suposto sê-la e é de facto. Mas o meu fundinho diz que não, que não é bem assim.
Odeio ter consciência de que o meu sentimento é uma farsa. Uma farsa que sinto e vivo de verdade.
As coisas recompõem-se, o que é diferente de voltar ao que eram. Ajeitam-se, empurram-se e saem daí novas coisas, não necessariamente piores.
A minha orquídea Cymbidium está murchinha. Tipo eu. Amarelou como o meu sorriso, e as folhas esmoreceram como a minha disposição. Tenho-a há 3 anos e depois de uns descuidos de falta de água, seguida de excesso, ela nunca mais foi a mesma. Resiste estoicamente desde o verão, à medida que vai decaindo lentamente, sem qualquer crescimento ou floração. Olho para ela e a esperança começa a esmorecer. Já a vejo como uma planta moribunda, à espera do dia. Sei exactamente como se sente: tristinha por ter sido destratada. Desgostada, no fundo, tal como eu.
Uma planta que em tempos foi de uma beleza extraordinária, com pequenas florinhas carmim subindo em espiral numa guia com 1m de comprimento. Hoje é uma planta com conteúdo, que é muito mais difícil de produzir do que flores e folhas viçosas. Lembra-me diariamente o quanto a negligenciei, na maior parte das vezes por ignorância da minha parte, mas não deixa de me fazer companhia e de teimar em continuar de pé só para não me dar o desgosto.
Adoro aquela orquídea.
E todos os dias o meu olhar preocupado lhe traduz estas palavras.
28 fevereiro 2008
26 fevereiro 2008
A Sr.a Ministra da Educação usa Botox!!!
Só pode!
Tempos houve em que depois de um debate sobre as questões quentes da educação, ou das fantochadas que a educação pode ser, eu só conseguia articular ofensas e indignações na direcção da Sr.a Ministra.
Hoje confirmei que a Ministra, fazendo parte do quadro político, só pode ter um gene que permite fugir à verdade e pior que isso, mentir descaradamente. Há aqui um descaramento que até custa a acreditar. Mas hoje, em tanta conversa fiada, ficou-me a confiança na Sr.a Ministra, que tanta coragem mostrou em fingir que a avaliação de professores só ilícitamente será explorada em proveito próprio. Parece-me que esta avaliação está para os professores, como a droga em estado puro está para um junkie. É para a pessoa se lambusar toda na desgraça e curtir a viagem ao fim do mundo.
Custa-me saber que amanhã vou dar aulas a uma turma pequena, em que há um aluno que se recusa a fazer as coisas a não ser que eu esteja ao lado dele a controlar o trabalho. De cada vez que me afasto ele pára, como se ele fosse movido pela minha própria energia. Que posso eu fazer quando o aluno não quer fazer as coisas por si? Que posso eu fazer quando outro aluno me diz que até tem tempo para estudar, e condições, e tudo, e tudo, e tudo, só que não gosta de o fazer. Como posso entrar na cabeça destes meninos, para os fazer estudar, para os fazer tirar boas notas, para que eu possa ser também agraciada com uma linda menção à frente do meu nome?
Não posso. E olhem que já tentei muita coisa.
Podem vocês pensar que as minhas palavras de outros tempos, afinal se repetem, mas não. A minha revolta é interior, não imaginam o quanto me sinto enxovalhada, e quanto da minha angústia estou a calar. Acontece que estou farta de criticar, de dizer mal, e de nada acontecer, pelo que hoje pensei só em dizer coisas boas.
Por isso Sr.a Ministra, depois de tudo o que vi e ouvi na orquestração que foi este puppet show televisivo, quero simplesmente louvar os seguintes grupos, porque ainda os há:
- os alunos que alguma vez na sua vida abdicaram de algo para estudar e conseguir os seus objectivos na escola;
- os alunos que sentem prazer em aprender;
- os alunos que se levantam a horas para comparecer assiduamente e sempre pontuais às aulas.
- os alunos que confiam no professor, e em quem o professor pode confiar;
- os professores que abdicaram da sua vida pessoal para que o trabalho ficasse bem feito, independentemente da jornada de trabalho ou do horário que lhe pagam;
- os professores que procuram encontrar soluções, em vez de apontar só problemas, num trabalho empenhado feito para e com alunos;
- os professores que trabalham todos os dias com as suas realidades e não com estudos, relatórios e estatísticas que dizem que tudo vai bem;
- e por fim, os professores que têm um gosto genuíno em ensinar e sabe-se lá porquê, teimam em querer realizar o seu sonho diariamente.
Nada disto comove a Ministra, porque ela quer saber é dos números, das refeições, das Novas Oportunidades, das estatísticas, dos resultados escolares. Nada disto lhe faz enrugar a fronte, ou franzir o sobrolho. Nada disto são preocupações que mereçam a cara marcada pela incerteza do que nos reservará o futuro.
A Sr.a Ministra mal consegue forçar um sorriso, quanto mais uma expressão complexa como a da genuína preocupação e solidariedade com uma classe que comanda.
Sejamos francos, a culpa também não é da senhora. Aquela testa não deixa enganar: tem menos rugas do que eu! Os movimentos faciais resumiam-se a uma contorção da fenda bocal (perdoem o termo técnico, mas não lhe posso chamar outra coisa!) e ao fechar pausado das pálpebras enquanto falava.
Nada mais se mexia.
Incrível! Como é que ela consegue?
Com Botox, claro.
Só pode!
P.S. - Um beijo a todos os que vêem o dia acabar e lhes sobra esta sensação de que tudo está errado (seja connosco, com os outros, ou com o resto do mundo). Tudo muda, e já amanhã chega a primeira oportunidade para isso. Por isso, larguem lá o botox e dêem-me um sorriso antes de adormecerem.
:)
Tempos houve em que depois de um debate sobre as questões quentes da educação, ou das fantochadas que a educação pode ser, eu só conseguia articular ofensas e indignações na direcção da Sr.a Ministra.
Hoje confirmei que a Ministra, fazendo parte do quadro político, só pode ter um gene que permite fugir à verdade e pior que isso, mentir descaradamente. Há aqui um descaramento que até custa a acreditar. Mas hoje, em tanta conversa fiada, ficou-me a confiança na Sr.a Ministra, que tanta coragem mostrou em fingir que a avaliação de professores só ilícitamente será explorada em proveito próprio. Parece-me que esta avaliação está para os professores, como a droga em estado puro está para um junkie. É para a pessoa se lambusar toda na desgraça e curtir a viagem ao fim do mundo.
Custa-me saber que amanhã vou dar aulas a uma turma pequena, em que há um aluno que se recusa a fazer as coisas a não ser que eu esteja ao lado dele a controlar o trabalho. De cada vez que me afasto ele pára, como se ele fosse movido pela minha própria energia. Que posso eu fazer quando o aluno não quer fazer as coisas por si? Que posso eu fazer quando outro aluno me diz que até tem tempo para estudar, e condições, e tudo, e tudo, e tudo, só que não gosta de o fazer. Como posso entrar na cabeça destes meninos, para os fazer estudar, para os fazer tirar boas notas, para que eu possa ser também agraciada com uma linda menção à frente do meu nome?
Não posso. E olhem que já tentei muita coisa.
Podem vocês pensar que as minhas palavras de outros tempos, afinal se repetem, mas não. A minha revolta é interior, não imaginam o quanto me sinto enxovalhada, e quanto da minha angústia estou a calar. Acontece que estou farta de criticar, de dizer mal, e de nada acontecer, pelo que hoje pensei só em dizer coisas boas.
Por isso Sr.a Ministra, depois de tudo o que vi e ouvi na orquestração que foi este puppet show televisivo, quero simplesmente louvar os seguintes grupos, porque ainda os há:
- os alunos que alguma vez na sua vida abdicaram de algo para estudar e conseguir os seus objectivos na escola;
- os alunos que sentem prazer em aprender;
- os alunos que se levantam a horas para comparecer assiduamente e sempre pontuais às aulas.
- os alunos que confiam no professor, e em quem o professor pode confiar;
- os professores que abdicaram da sua vida pessoal para que o trabalho ficasse bem feito, independentemente da jornada de trabalho ou do horário que lhe pagam;
- os professores que procuram encontrar soluções, em vez de apontar só problemas, num trabalho empenhado feito para e com alunos;
- os professores que trabalham todos os dias com as suas realidades e não com estudos, relatórios e estatísticas que dizem que tudo vai bem;
- e por fim, os professores que têm um gosto genuíno em ensinar e sabe-se lá porquê, teimam em querer realizar o seu sonho diariamente.
Nada disto comove a Ministra, porque ela quer saber é dos números, das refeições, das Novas Oportunidades, das estatísticas, dos resultados escolares. Nada disto lhe faz enrugar a fronte, ou franzir o sobrolho. Nada disto são preocupações que mereçam a cara marcada pela incerteza do que nos reservará o futuro.
A Sr.a Ministra mal consegue forçar um sorriso, quanto mais uma expressão complexa como a da genuína preocupação e solidariedade com uma classe que comanda.
Sejamos francos, a culpa também não é da senhora. Aquela testa não deixa enganar: tem menos rugas do que eu! Os movimentos faciais resumiam-se a uma contorção da fenda bocal (perdoem o termo técnico, mas não lhe posso chamar outra coisa!) e ao fechar pausado das pálpebras enquanto falava.
Nada mais se mexia.
Incrível! Como é que ela consegue?
Com Botox, claro.
Só pode!
P.S. - Um beijo a todos os que vêem o dia acabar e lhes sobra esta sensação de que tudo está errado (seja connosco, com os outros, ou com o resto do mundo). Tudo muda, e já amanhã chega a primeira oportunidade para isso. Por isso, larguem lá o botox e dêem-me um sorriso antes de adormecerem.
:)
14 fevereiro 2008
Os pratos são só três...
- Ainda há jantar?
- Só há massa, filha.
- Não faz mal, é só para não me deitar de estômago vazio.
Olho para a mesa e os pratos são só três. Imagino aquela mesa quando eu ali não estou. É que eu sou faladora, opinativa... bom, sou como as crianças pequenas: ninguém as atura, mas quando não estão até se sente falta do reboliço. E aqueles três ali comem sozinhos, com a minha mãe a papaguear tudo sozinha.
Ontem comi a massa e tudo me fez sentir triste. Os pratos, a massa, o cheirinho da minha mãe a pedir mais beijinhos de despedida, o meu pai (que é sempre o mais calado de todos) a tentar fazer conversa para me ter ali mais um bocadinho, o papagaio que me devolveu em perfeita imitação o meu "Até logo", os cães que olharam para mim com o ar mais desgostoso (que eu confundi com fome) e a quem servi o jantar, mal sabendo que já tinham comido à tarde.
Tudo me fez triste, tudo me faz triste. As horas no relógio, o sol a brilhar morninho, a bolacha caída no chão do meu carro, o Daniel Sampaio no Rádio Clube Português... tudo me faz triste porque é Fevereiro.
Por esta altura começo a estranhar a minha tristeza, a minha falta de acção e dou comigo a questionar se não estarei em depressão. Já aprendi que quando fazemos a pergunta, já lá estamos há algum tempo.
Choro, um bocadinho, porque é sempre um bocadinho, e porque por muito que aprenda, chorar para mim é fraqueza, na qual me deixo levar, sempre e só, um bocadinho.
Faço umas limpezas gerais à casa e a cabeça fica mais limpa.
Vêm as andorinhas, e de repente, já é Verão, e eu não sei mais da depressão.
Tudo agora faz diferença, tudo agora me incomoda, daqui para a frente não passarão de "mariquices de gaja". Mas neste momento, tudo são bons pretextos para ficar triste. Qualquer um serve, porque eu só preciso de pretexto para dar sentido à tristeza, porque essa já se instalou sem pretexto nenhum.
E hoje penso nos pratos, por serem só três.
Penso na casa grande que deixei para trás: fria, vazia e sem sentido.
Penso que as coisas fazem falta. Que cinco pessoas é uma festa e três é só uma multidão. Que perdi a minha avó e, porra, tenho saudades dela.
Os pratos são só três.
E raios os partam.
09 fevereiro 2008
Quando eu for grande queria ser manequim!
Quando eu for grande queria ser manequim.
Nem boa, nem má:
assim assim.
Não há chuva nem vento,
e o sol bate certeiro.
Ser manequim é um sonho,
especialmente em Fevereiro.
Ver as pessoas na rua,
distraídas como vão.
Nem se eu estivesse nua
me davam atenção.
Do lado de dentro o quentinho,
Do lado de fora o agasalho
Passo o dia sem fazer nada
enquanto outros vão pró trabalho.
A vida é leve, sem problemas,
separada do resto do mundo.
É como viver num aquário,
mas não muito profundo.
Vestida com roupa da moda,
haute couture ou pronto-a-vestir,
num cenário cheio de classe.
Que mais se pode pedir?
Que vontade esta a minha,
de dos outros me separar?
Se o vidro fosse mesmo fininho
acho que ninguém ia notar.
Não me preocupam as doenças,
não é esse o meu dilema.
É que as cenas ruins da vida
eu prefiro ver como no cinema.
03 fevereiro 2008
Se a realidade fosse bonita, ninguém tinha inventado a mentira!
Bom, talvez seja da chuva que fez durante a noite...
Não sei bem o que dizer, o que fazer da minha vida...
Tudo parece distorcido. A minha realidade contorce-se ao sabor dos meus pensamentos, das minhas angústias, dos meus medos.
Quando estou em dúvida apetece-me sempre espreitar o guião, e descobrir de uma vez o que me reserva o futuro. Sou curiosa, pois então! E assim, deixava de ver o mundo desta maneira adulterada, para ver as coisas como elas realmente são.
O realmente ser é uma bruta duma chatice, para não dizer uma verdadeira maçada!
Realmente ser não é existir na realidade, é ser uma realidade aborrecida. Sem meandros para explorar, sem imprevisibilidades, sem mutações, sem movimento, sem vida.
Mas eu sou uma rapariga prática, que gosta de saber com o que conta. Não gosto de andar à deriva, de me perder em ilusões.
E tão depressa sou curiosa, como sou realista.
E tão depressa passo do realismo para o devaneio.
E já não estou aqui, já me deixei levar pelas imagens, quais reflexos no cristalino do meu olho.
Ficção? Talvez.
Engano? Mais que certo.
Mas belas mentiras... quem pode resistir?
IMAGEM: Antoni Gaudí, Casa Batló, Barcelona.
