28 fevereiro 2008

Estou murchinha e não é falta de água

Não tenho nada de jeito para dizer, mas exactamente por isso me apetece falar.
Não gosto de estar calada, não gosto de silêncios incomodativos. Gosto de falar até não mais poder ouvir a minha própria voz, coisa que até acontece amiúde (felizmente).

Estou murchinha, como o tempo. Oiço os passarinhos lá fora, mas dentro de mim ainda chove. Estou desgostada com as pessoas.
É isso.
Desgostada.

Não falo do meu desgosto de mim, porque esse vivo diariamente, sempre a pensar no que faço de mal e no que podia fazer melhor. Desiludo-me a cada momento, mas agora já vou conseguindo encarar que, apesar do erro, ainda tenho a possibilidade de o consertar e/ou de o não voltar a cometer no futuro. A pessoa perdoa-se a si própria e tudo fica bem.

Mas os outros... gostava de não ficar sentida com certas coisas, porque não é chateada. É sentida. São coisas que me magoam e, sabe-se lá porquê, fico triste por terem acontecido, e por isso não as consigo engolir/ultrapassar assim do pé para a mão.
Normalmente, finjo que vivo bem com essas vicissitudes, e olho só para as árvores a rebentar verdinhas, para o melro poisado no pilar do portão da casa dos meus pais, para os desenhos que as núvens fazem no céu, para as andorinhas que aquecem o ninho duplex na entrada da porta, para os ciclistas que apanho a caminho da escola com aqueles glúteozinhos que parecem, vá, bombons, e a quem não resisto mandar uma apitadela e um aceno de motivação.
Finjo que a vida é bela, porque é suposto sê-la e é de facto. Mas o meu fundinho diz que não, que não é bem assim.

Odeio ter consciência de que o meu sentimento é uma farsa. Uma farsa que sinto e vivo de verdade.
As coisas recompõem-se, o que é diferente de voltar ao que eram. Ajeitam-se, empurram-se e saem daí novas coisas, não necessariamente piores.

A minha orquídea Cymbidium está murchinha. Tipo eu. Amarelou como o meu sorriso, e as folhas esmoreceram como a minha disposição. Tenho-a há 3 anos e depois de uns descuidos de falta de água, seguida de excesso, ela nunca mais foi a mesma. Resiste estoicamente desde o verão, à medida que vai decaindo lentamente, sem qualquer crescimento ou floração. Olho para ela e a esperança começa a esmorecer. Já a vejo como uma planta moribunda, à espera do dia. Sei exactamente como se sente: tristinha por ter sido destratada. Desgostada, no fundo, tal como eu.
Uma planta que em tempos foi de uma beleza extraordinária, com pequenas florinhas carmim subindo em espiral numa guia com 1m de comprimento. Hoje é uma planta com conteúdo, que é muito mais difícil de produzir do que flores e folhas viçosas. Lembra-me diariamente o quanto a negligenciei, na maior parte das vezes por ignorância da minha parte, mas não deixa de me fazer companhia e de teimar em continuar de pé só para não me dar o desgosto.
Adoro aquela orquídea.
E todos os dias o meu olhar preocupado lhe traduz estas palavras.

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