28 junho 2009

Ontem estive num casamento.
Hoje já estive num velório.

Estranho é o curso da vida, essa telenovela de enredo misterioso, que nos surpreende com fantásticas e terríveis reviravoltas.
Ontem testemunhei, mais uma vez, o desejo de duas pessoas se unirem e manifestarem a sua dedicação para uma vida inteira. Foi bonito, como sempre é. Dá-nos alguma esperança para acreditar que há qualquer coisa humana que pode, de facto, ser eterna. E há. A saudade.

Hoje soube que o marido de uma amiga minha faleceu (com 34 anos, vejam só!). Eu tinha ido ao casamento deles há uns anos atrás, e naquele dia ninguém sonhava a não ser com um futuro risonho.

O futuro não se escolhe, e ele decidiu-se por não sorrir.
Não houve filhos e, portanto, dilemas para explicar "onde está o pai, mãe?".
Ela ficou só, nos seus frescos 34 anos anos. Uma viúva com cara de menina.
"Impossível", pensei eu. "Não está certo."
E relembro-me que a vida é um concurso, onde nem sempre ganha o que mais sabe, mas aquele que tem sorte. E ela teve azar, porque perdeu a sua cara-metade, e a partir de agora volta a fazer sozinha, o que até aqui fez a meias.
Está inconsolável, pois está. E estamos todos nós por vê-la assim, inconsolável, sem saber como se redesenhar para aceitar a crueldade dos factos: ele está estendido sob uma manta de flores, e os seus olhos não mais se abrirão para lhe dizer como a ama.

Percebo agora que estas situações nos chocam, porque revivemos nas mortes dos outros as mortes dos nossos. Porque, de repente, ao vermos no rosto do outro uma falta materializada, sentimos também a falta que os nossos nos fazem. E que falta...
Doi de novo.
Doi por vermos que é duro, e que não pára de acontecer à nossa volta.
E pior que tudo, "temos de nos conformar"!

Temos de nos conformar???
Temos de nos conformar?????
Mas quem raio inventou esta? Conformar?

Conformar, que eu saiba, é tomar a forma de qualquer coisa. Tomar a forma de um desgosto é viver nele para sempre. E eu não desejo que ninguém se conforme para ser infeliz uma vida inteira. Apesar do turbilhão que ela deve estar a sentir, ela tem de ter ideias muito racionais acerca de si e do seguimento que pretende dar à sua vida, porque daqui para frente a sua preocupação é não deixar que os sentimentos tomem conta de si. Para que esta morte tenha sentido, e não faça da sua vida uma existência sem sentido nenhum.

Temos de nos conformar...
Eu nunca me vou conformar com nada! Não me quero moldar ao desgosto, porque apesar de saber que não lhe posso escapar, sei que quem está do outro lado gostaria de me ver a moldar a minha vida, e não a "conformá-la".

A morte tem este dom estúpido e óbvio: o de nos lembrar que tudo é breve e passageiro. De que os planos são rídiculos se partirem das personagens e não do Realizador. A história não é nossa só porque nos cabe a nós representá-la. Mas pensamos sempre que sim...
Somos só actores. Não nos cabe mudar a história, no entanto, é da nossa responsabilidade o que fazemos com ela.

O guião está feito, mas a interpretação é nossa.
A morte será sempre a morte, porque arrasta lágrimas e boas recordações com ela, leva-nos o ânimo e os projectos, rouba-nos o alento e as forças. Mas é um passo, nem sequer o mais importante, da vida de uma pessoa.

Não faz sentido chorar pela flores que nos murcham nas jarras. Tal como nós, elas têm o seu tempo. Nós só nos podemos dar por felizes por cada dia que nos presentearam com a sua beleza, por cada dia que nos fizeram sorrir, por cada dia que nos animaram o rosto só de as ver.

Não gosto de lamentar pelas flores da minha vida, porque o seu significado nunca se alterará apenas por terem murchado. Isso só as tornou mais especiais. Tornou cada momento único e especial, digno de ser guardado para sempre.

Ontem apanhei (pela primeira vez e finalmente!!) o ramo da noiva.
Amanhã é outro dia, e hoje ele é só um apanhado de flores com um fim traçado, como todos nós.
E, por agora, não me apetece moldá-lo mais do que isso.

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