14 fevereiro 2008

Os pratos são só três...

À quarta à noite é dia de aulas. Das 19h às 22h10. Saio mesmo na hora do jantar e, normalmente, segue comigo uma sandes e um sumo para calar o estômago durante o trabalho. Ontem não tinha fome. Não lanchei, mas não tinha fome. E fiquei sem comer até às 22h30, altura em que cheguei a casa dos pais para roubar os restos.

- Ainda há jantar?
- Só há massa, filha.
- Não faz mal, é só para não me deitar de estômago vazio.

Olho para a mesa e os pratos são só três. Imagino aquela mesa quando eu ali não estou. É que eu sou faladora, opinativa... bom, sou como as crianças pequenas: ninguém as atura, mas quando não estão até se sente falta do reboliço. E aqueles três ali comem sozinhos, com a minha mãe a papaguear tudo sozinha.

Ontem comi a massa e tudo me fez sentir triste. Os pratos, a massa, o cheirinho da minha mãe a pedir mais beijinhos de despedida, o meu pai (que é sempre o mais calado de todos) a tentar fazer conversa para me ter ali mais um bocadinho, o papagaio que me devolveu em perfeita imitação o meu "Até logo", os cães que olharam para mim com o ar mais desgostoso (que eu confundi com fome) e a quem servi o jantar, mal sabendo que já tinham comido à tarde.


Tudo me fez triste, tudo me faz triste. As horas no relógio, o sol a brilhar morninho, a bolacha caída no chão do meu carro, o Daniel Sampaio no Rádio Clube Português... tudo me faz triste porque é Fevereiro.
Por esta altura começo a estranhar a minha tristeza, a minha falta de acção e dou comigo a questionar se não estarei em depressão. Já aprendi que quando fazemos a pergunta, já lá estamos há algum tempo.
Choro, um bocadinho, porque é sempre um bocadinho, e porque por muito que aprenda, chorar para mim é fraqueza, na qual me deixo levar, sempre e só, um bocadinho.
Faço umas limpezas gerais à casa e a cabeça fica mais limpa.
Vêm as andorinhas, e de repente, já é Verão, e eu não sei mais da depressão.

Tudo agora faz diferença, tudo agora me incomoda, daqui para a frente não passarão de "mariquices de gaja". Mas neste momento, tudo são bons pretextos para ficar triste. Qualquer um serve, porque eu só preciso de pretexto para dar sentido à tristeza, porque essa já se instalou sem pretexto nenhum.

E hoje penso nos pratos, por serem só três.
Penso na casa grande que deixei para trás: fria, vazia e sem sentido.
Penso que as coisas fazem falta. Que cinco pessoas é uma festa e três é só uma multidão. Que perdi a minha avó e, porra, tenho saudades dela.

Os pratos são só três.
E raios os partam.

4 comentários:

Anónimo disse...

A tristeza é uma variação dos afectos, acho eu. As pessoas que não se intristessem talvez sejam duras de mais (ou talvez não), talvez não gostem das pessoas como tu gostavas da tua avó. Quando voltares a ter alegria talvez a sintas com mais euforia do que se fosses uma pessoa neutra em que na leitura do teu gráfico de humores fosse uma linha recta.

Pensa em tudo o que tens e não no que não tens, vais ver que é uma imensidão!

Luís

Anónimo disse...

Olá, Sofia

Quando estamos felizes, lidamos com isso de forma natural, sem pensarmos muito nas razões por que estamos assim. Vivemos em plenitude esse estado de graça e de ventura. Porém, das nossas tristezas apercebemo-nos sempre. Analisamo-las ao detalhe, dissecamo-las, examinando-as sob os mais diversos primas de modo a descobrir as suas causas e origens como se, pelo facto de estarmos tristes, fosse um comportamento anti-natura. Não o é. Ninguém é um “Las Vegas” constante e, se o diz ser, é por finge, mente. E estes sim negam a condição humana.

Não quero com isto dizer que a vida tem de ser triste ou que tenhamos que vivê-la tristemente. A vida não é triste, ela pauta-se por algumas horas de tristeza, de solidão, de saudade… “Felizmente” (e aqui o jogo de palavras é intencional) é sob as asas do tempo que a tristeza e a dor se vão, tal como a seguir ao Inverno, chega a Primavera.

Nunca é sempre Inverno, assim como nunca é sempre Primavera…

Beijinho cheio de amizade.

Anónimo disse...

Uma linha recta...

Eu não sou uma linha recta.
Nunca o fui, e nunca o serei, por muito que queira ou tente.
Eu sou um ecossistema típico do aquecimento global: com verões quentes de seca, e invernos de tempestadades e cheias.

Bem queria eu ser uma sucessão de Primaveras... não, para ser sincera não queria.

É que as coisinhas simples da minha vida têm o poder de me incomodar, de me electrocutar, de mexer comigo, para o bem e para o mal.

Amanhã, ou sejamos realistas, dentro em breve, cantarei ao esquivo raio de sol que começa agora a entrar na janela do meu quarto, logo pela manhã.

Sim, porque eu sou pelas curvas, e quanto mais acentuadas melhor! ;)

Anónimo disse...

Sugeri que, precisamente, não me parecias uma linha recta, e expliquei que ainda bem que o não és, pois tal caracteríztica não é muito abonatória do ponto de vista humano.

;~)

Luís