18 setembro 2009

Paisagem interior

Turvam-se-me as cores por dentro.
E sinto-me, cada vez mais, longe de tudo.

Apetece-me chorar tanto que não consigo soltar uma única lágrima e, no entanto, consigo reagir com uma intensidade desmesurada a tudo o que se passa à minha volta.

Estou triste.
Sou triste por natureza.
E sem razão.

A razão nada que tem que ver com a tristeza. Não é causa da consequência, não são parceiras. Mas nem isso me impede de teimar em dissecar a minha tristeza com pequenas razões.

Sinto-me a afogar. Sim, a afogar.
Como se o pano de fundo da minha vida fosse uma aguarela a virar em aguada. Diluo-me nas circunstâncias presentes e nada me dá a consistência própria para pintar a vida com realidade.

Estou tão triste...

Temi escrever aqui, ou em qualquer outro lado. As palavras são sempre duras, especialmente para quem não as quer ouvir. Tento planear o meu aniversário e nem isso consigo. Nada me apetece. Nada.

Tenho um gigantesco remoínho, um nó enorme na superfície da minha tela, que faz de tudo o que eu faça uma perda de tempo. Sinto a minha vida parada como um bloqueio da tela branca. Um bloqueio que eu imponho a mim própria e que por isso me envergonha, e me mancha o meu mais sincero sorriso.
Não sei porque fiquei assim, não identifico a razão certa na fila dos suspeitos. Só sei que sou vítima de mim própria, dos meus próprios medos, das minhas angústias, do meu sistema nervoso.

Estou a render-me à alergia, à enxaqueca e à gastrite desta semana. Sinto-me frágil e transparente, e o preto até na pintura contamina tudo sem piedade.
Sinto que não gosto de mim.
Sinto que os outros não gostam de mim.
Sinto que todos nós, eu e os outros, temos boas razões para isso.
(Estou finalmente a chorar...)

Sinto que já fiz coisas extraordinárias, das quais já só guardo a glória, como qualquer português que se orgulha do passado dos Descobrimentos, e hoje apenas rejubila por não estar em último na cauda da Europa.

Caramba... Se alguém imaginasse o que para mim consegue ser um problema... dava um programa para rir. Tudo me afecta, tudo me constrange, tudo me faz sentir cada vez mais pequenina neste 1,65 m.

Fazem-se as perguntas da praxe, afinal, as únicas a que realmente importa dar resposta.
Quem sou eu?
Donde venho?
Para onde vou?
Sou uma ignorante.
Trinta anos de treino e ainda não tenho resposta para isto.

Sou uma aprendiz sem mestre. Sou uma autodidacta da vida. Queria que alguém me dissesse como estruturá-la, como colori-la de forma soberba, como tratar todos os seus pormenores. Queria ser ensinada, mas parece que vou ter de "arranhar" e "esgravatar" sozinha, tal como peço aos meus alunos para o fazerem.
Não sei qual é o meu verdadeiro talento, mas ver para além da composição de obstáculos não é definitivamente um deles.
Pinto e repinto a minha vida nestas palavras, e nada parece sair bem.
Melhor é deixar secar um pouco e depois voltar a retocar por cima.

1 comentário:

Cláudia Silva disse...

Olá, Sofia.

Estás triste e com razão. Há sempre uma razão para a tristeza, mais que não seja química ou hormonal. Tenho como convicção que ninguém se sente triste por vontade ou por decisão. Encontro, por isso, legitimidade nas tuas palavras doridas. Não é errado, não é invulgar e não é estranho sentires-te assim. Faz parte da tua humanidade. Não te recrimines pela tua mágoa, pela tua ferida ou pela tua angústia. A culpa por as sentir pode ser, ela sim, fortemente erosiva.
Não quero com isto que te escrevo fazer a apologia da tristeza, muito pelo contrário. Eu acredito que já tenhas efectuado um íntimo processo de reflexão sobre as razões do teu desalento, racionalizando-as e objectivando-as para que possas, ultrapassada esta fase de necessária meditação, encontrar novos caminhos conducentes a um estado de graça.
As linhas que escreveste são reveladoras de um estado catártico, expiatório e assumem um tom libertador. Se, por um lado, põem a descoberto as tuas fragilidades (mas quem não as tem?), por outro (e muito mais importante do que o primeiro) demonstram uma corajosa capacidade de confrontação das mesmas. E isto, minha querida amiga, tem muito mérito.

No último pedacinho do teu texto, questionas-te sobre a melhor forma de estruturar a vida, dando, no fundo, vida à própria Vida. Este problema não tem resposta fácil. Se olharmos a Vida de frente, de forma destemida e arriscada, vamos perceber sem grandes delongas que a Vida é, de modo crú e duro, um percurso de desilusões sucessivas. Só não o será se conferirmos à desilusão, condição intrínseca da Vida, a possibilidade de se renovar constantemente, tecendo, por sistema, novos ideais e novas metas.


Beijinhos